É possível uma pecuária mais sustentável?

O desenvolvimento de meios para uma pecuária mais sustentável é um dos grandes desafios do agronegócio brasileiro, frente às cobranças da comunidade internacional 

A pecuária brasileira – sobretudo a bovina de corte – é a que mais sofre pressão internacional para que atue de forma mais sustentável e transparente.

Isso porque, ao longo dos anos, o setor teve seu crescimento associado ao avanço do desmatamento da Amazônia e às emissões de metano (CH4), que contribuem para o aquecimento global.

Apesar de as pressões serem atuais, há anos são realizadas no Brasil pesquisas para o desenvolvimento de sistemas de produção que proporcionem à pecuária sustentabilidade e competitividade no cenário global. 

Tais pesquisas estão relacionadas com a pecuária de precisão e a pecuária 4.0, que utilizam tecnologias para uma gestão eficiente e sustentável do setor.

Ou seja, é possível sim realizar uma pecuária sustentável. Neste artigo você entenderá sobre esses sistemas de produção e os desafios que precisam ser superados para haver mais avanços.

O que é a pecuária sustentável?

A pecuária sustentável reúne um conjunto de técnicas, aliadas à tecnologias, que visam a produção de carne, couro, leite e derivados com consciência ambiental, eficiência, bem-estar animal e responsabilidade social.

Atuar de forma sustentável deve ser uma meta de todo pecuarista. Até mesmo para se manter competitivo no concorrido mercado de proteína animal e de couro.

O Brasil é o principal exportador mundial de carne bovina, um dos principais itens na pauta de exportações do país.

E a tendência, de acordo com o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), é de que o Brasil será responsável por 29% das exportações mundiais de carne bovina até 2030.

Até lá, o Brasil deve crescer em 41,88% as exportações do produto. Mas, para isso, precisa aperfeiçoar seu sistema de produção, sobretudo no que se refere à transparência.

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Assim, a tendência é que haja também um avanço das técnicas que já vêm sendo desenvolvidas de pecuária de precisão e de pecuária 4.0.

Pecuária de precisão e Pecuária 4.0

Dentre as características da pecuária de precisão, estão, por exemplo:

  • a identificação animal automatizada;
  • uso de dispositivos eletrônicos para pesagem;
  • colares com sensores que transmitem dados sobre cada animal;
  • bebedouros e cochos automáticos;
  • o uso de estações meteorológicas automática nas áreas.     

A pecuária 4.0, por sua vez, representa os avanços da pecuária de precisão, com a utilização cada vez maior de processos de manejo automatizados. 

Monitoramento do microclima com a BoosterPRO

A pecuária 4.0 faz uso, por exemplo, da inteligência artificial, da internet das coisas (IoT) e do big data, que favorecem à automação dos processos e a interpretação dos dados coletados em campo em tempo real para tomada mais rápida e otimizada das decisões.  

Um exemplo disso é uma pesquisa que mostrou ser possível, com o uso de tecnologias, identificar o cio de uma vaca com 6 horas de antecedência, o que pode tornar o manejo reprodutivo mais eficiente.

Como aliar pecuária e sustentabilidade?

Ao longo dos anos, diversos modelos de pecuária sustentável – sobretudo voltado para a produção de carne bovina – vêm sendo desenvolvidos por instituições públicas e privadas, a principal delas a Embrapa.

Dentre os objetivos desses novos sistemas de produção estão: a redução de insumos e de água; bem como das emissões de gás metano, expelido pela boca dos bovinos durante o processo digestivo; e o sequestro de carbono da atmosfera.

Veja abaixo alguns detalhes sobre um desses sistemas de produção.

Sistema ILPF

Um dos sistemas que mais tem colaborado para o desenvolvimento de uma pecuária sustentável no país é o ILPF (Integração Lavoura-Pecuária-Floresta).

Desenvolvido pela Embrapa, o sistema envolve a produção de carne e leite na mesma área que a de grãos, fibras, madeira e energia, dentre outros.

Na ILPF, ocorre: o plantio, durante o verão, de culturas anuais (soja, sorgo, milho, feijão, arroz); de árvores, associados às espécies forrageiras (capins braquiária ou panicum); e a criação de animais.

O tipo de combinação que será feita depende de cada local de produção, e pode ser lavoura-pecuária-floresta, lavoura-pecuária, silvipastoril ou agroflorestal.

Dentre os benefícios desse sistema, estão o uso mais eficiente dos recursos naturais (terra, água), da mão de obra e dos insumos agrícolas.

Ocorre, ainda: a melhoria na qualidade do solo e da água, com possibilidade de redução do uso de agrotóxicos; além da menor vulnerabilidade do sistema aos riscos climáticos.

De acordo com estudos, o retorno do investimento no ILPF é maior do que áreas de produção com lavoura ou pecuária em sistemas isolados.

Além disso, esse sistema colabora para o bem-estar dos animais, que possuem mais sombra para descansar, o que reduz o estresse e a sede.

Tecnologias também estão sendo utilizadas no sistema ILPF com vistas a uma maior eficiência na gestão agrícola, com o uso de sensores, colares inteligentes e balanças de pesagem integradas e conectadas à internet.

Monitoramento da lavoura com imagens de satélite NDVI e NDMI

Crédito de carbono na pecuária 

As pesquisas têm mostrado que também é possível gerar crédito de carbono na pecuária, a partir da média lotação do pasto, com 3,3 UA (unidades animais) por hectare.

Nesse sistema é possível, ainda, a recuperação de pastagem degradada e a neutralização dos GEEs (gases de efeito estufa) por parte da pecuária (metano ruminal, metano e óxido nitroso do sistema solo-planta).

Um destaque do estudo é que os sistemas de produção intensificados de sequeiro, com média lotação animal em pastagem de brachiaria, e alta lotação animal em pastagens de panicum apresentam maior sequestro de carbono no solo em relação às emissões de GEEs.

Esse sistema, conforme a pesquisa, possui balanço de carbono positivo, o que representa créditos de carbono equivalentes ao crescimento de 6,27 árvores de eucalipto para cada animal do sistema de sequeiro, com média lotação, e 1,08 árvore para cada animal  no sistema com alta lotação.

Desafios para uma pecuária mais sustentável

O uso de tecnologias na pecuária brasileira, mesmo com a baixa conectividade do campo, tem conquistado diversos avanços práticos, tanto de pesquisas quanto ao seu uso nas propriedades rurais.

Ampliar a conectividade é um dos principais desafios para o setor. Mas, a situação que pode começar a ser revertida com a chegada da internet 5G no agronegócio.

Contudo, o maior desafio do setor talvez seja comprovar aos compradores internacionais a origem da carne que estão consumindo, por meio de um sistema de rastreabilidade.

Porém, no Brasil, a rastreabilidade é obrigatória apenas para vegetais e frutas frescas destinadas à alimentação humana (nacionais e importadas), devido aos resíduos de agrotóxicos.

Para a pecuária, existe a instrução normativa nº 51/2018, do Mapa, instituiu o Sisbov (Sistema Brasileiro de Identificação de Bovinos e Búfalos), mas a sua adesão é voluntária.

A exceção é quando definida a obrigatoriedade em ato normativo ou para controlar eventuais problemas sanitários.

Basicamente, a rastreabilidade da pecuária no Brasil é feita por meio do sistema Agri Trace, da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).

São 12 protocolos privados aprovados, para as raças bovinas: angus, hereford, nelore, charolês, devon e wagyu. E atenda mais de 22 mil fazendeiros, 60 frigoríficos e mais de 2 milhões de carcaças certificadas.

O sistema de rastreabilidade da pecuária brasileira, contudo, tem sido alvo de contestações, principalmente por conta do seu complexo comércio interno.

É comum que um animal muitas vezes seja criado numa determinada área e quando chega a em certa idade (novilha ou adulto em fase de terminação) é comercializado, sem que haja registros rastreáveis da sua origem.

Conclusão

A pecuária sustentável é tão possível quanto necessária no Brasil, para que o setor permaneça competitivo no mercado internacional.

Para isso, é preciso que pecuaristas busquem meios de gestão eficiente da sua fazenda através de técnicas de pecuária de precisão e pecuária 4.0.

Da mesma forma, é necessário superar desafios como o da rastreabilidade da carne. Isso porque, o único registro dos animais é a GTA (guia de trânsito animal), documento impresso obrigatório para o transporte e que serve para atestar a origem e a sanidade animal.

Assim, para superar desafios e garantir que a pecuária brasileira seja sustentável e competitiva no mercado internacional, é preciso somar esforços de todo o setor.


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