O que esperar do clima e do mercado de grãos em 2020?
Conversamos com Tarso Veloso, Diretor de Operações na AgResource Company, para entender como China, Estados Unidos e o clima podem interferir no agro Brasileiro.
Parece redundante discutir temas de 2019 ainda em 2020. Mas o circuito de negociações dos Estados Unidos com a China se encerrou recentemente, e precisamos entender o que essa investida estratégica dos americanos vai proporcionar para o agronegócio brasileiro. O clima, por outro lado, é e sempre será um fator recorrente na tomada de decisão dos produtores, influenciando positiva ou negativamente na produtividade.
Pelo menos de acordo com os indicadores internos, como os dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o Produto Interno Bruto (PIB) do setor agro brasileiro deve aumentar 3% em 2020. Além disso, o levantamento “Perspectivas 2020” do CNA SENAR reportou que, na ausência de problemas meteorológicos, o Brasil poderá ser o maior produtor de soja do mundo, gerando 125 milhões de toneladas da oleaginosa.
Mas como a incerteza também faz parte da agricultura, sabemos que muita coisa pode acontecer, mudando completamente esse cenário. Para conhecer quais são as possibilidades para 2020, com base nas relações entre Estados Unidas e China e fatores climáticos, conversamos com Tarso Veloso, Diretor de Operações da ARC Mercosul, da AgResource Company – empresa de consultoria e pesquisa agrícola nacional e internacional, que prevê tendências de preços agrícolas nacionais e mundiais.
Impactos do mercado global no Brasil: quais movimentos no exterior serão sentidos pelo produtor Brasileiro?
Tarso Veloso explica que o mercado global deve ver crescimento em 2020, puxado pela redução da tensão na disputa comercial entre Estados Unidos e China. “O principal movimento no mercado internacional que vai impactar o produtor rural brasileiro será o acordo da fase 1 da guerra comercial entre Estados Unidos e China”, esclarece Veloso.
Desde o início da guerra tarifária entre os dois países, o Brasil foi de longe o maior beneficiado, exportando 85 milhões de toneladas de soja. Com o acordo entre as duas nações, a China precisará comprar mais soja e milho dos americanos, o que vai obrigar o Brasil a procurar outros mercados consumidores.
Com essa mudança, os impactos serão menores exportações e estoques maiores dentro do Brasil, com preços em baixa. “Mas até agora ninguém sabe ao certo qual quantidade de soja a China vai comprar dos EUA e se, de fato, o Brasil acumulará grãos. O que se sabe é que a China não irá mais evitar a soja americana, como aconteceu em 2018 e parte de 2019”, comenta.
O que o produtor precisa saber sobre o mercado de commodities em 2020?
Veloso explica que o mercado deve ficar menos volátil e os preços no Brasil continuarão rentáveis por conta do câmbio e prêmio de exportação. “A única preocupação que produtores devem ter neste ano é não deixar muita soja em aberto, por conta do risco de uma demanda menor vinda da China”, aponta.
O especialista lembra ainda que, por conta da gripe africana suína, os chineses terão que comprar mais soja dos americanos. “O único meio de gerar alta nos preços das commodities será uma quebra de safra no Brasil ou nos Estados Unidos, já que os estoques mundiais são adequados e impedirão elevações de preço sustentadas no médio prazo”, revela Veloso.
Quais são as projeções climáticas para o Brasil em 2020 e o que pode fazer a diferença para a soja e milho nesse início de ano?
Segundo Veloso, no curto prazo as previsões são bastante adequadas para praticamente toda a safra brasileira. “Após um início [de safra] com chuvas irregulares, especialmente no nordeste brasileiro, o que se vê agora são condições favoráveis para o desenvolvimento das lavouras”, comenta o diretor.
Na análise do especialista, o tempo seco nas últimas semanas no Rio Grande do Sul já aponta uma expectativa de cortes nas produtividades do milho verão. “Por outro lado, os efeitos para a soja foram limitados em função do plantio mais tardio e da boa capacidade de recuperação da cultura diante das condições climáticas previstas para a região”, explica.
Ponto a ponto
Argentina
“As condições não foram ideais durante o começo da safra na Argentina, mas com a ocorrência de uma boa recuperação logo em seguida, o nível de produtividade esperado foi mantido dentro da média normal. A preocupação por lá são as áreas produtivas mais ao sul do país, onde as condições foram irregulares e as previsões de curto prazo não são tão favoráveis como no centro e no norte do país. Apesar desse cenário, ainda é cedo para falar em cortes de produtividade na produção dos nossos vizinhos”.
Safrinha
“Por enquanto temos previsões climáticas de longo prazo majoritariamente favoráveis para a safrinha, mas ainda é cedo para garantir condições normais. O plantio provavelmente será atrasado, restringindo a janela de desenvolvimento do milho.
Para o centro-oeste e sudeste brasileiro, as previsões para o final de janeiro e para o mês de fevereiro são de chuvas acima da média normal dos últimos anos, o que se confirmado, trará condições iniciais adequadas para as lavouras. Em boa parte do Paraná as chuvas devem ficar levemente abaixo da média”.
Março
“Para o mês de março as projeções de longo prazo indicam chuvas acima da média no norte do Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais. Por outro lado, no Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná, a ocorrência de precipitações prevista está abaixo da normalidade para o mês. Isso levanta dúvidas sobre o impacto do clima nas lavouras dessas localidades, considerando que a distribuição das chuvas ao longo de março será determinante para a definição do potencial produtivo das culturas”.
Ainda de acordo com Tarso Veloso, são esperadas condições de chuvas dentro da normalidade em todo o país a partir do mês de abril. “A safra de verão conta com condições favoráveis enquanto a safrinha ainda permanece com um ponto de interrogação neste momento”, conclui o especialista.
Acompanhamento de safra da CONAB
Milho
De acordo com o último boletim de acompanhamento de safra da Companhia Nacional de Abastescimento (CONAB), as lavouras de milho verão, da safra 2019/2020, já se encontram totalmente semeadas na Região Centro-Sul e Matopiba, e apresentam bom desenvolvimento vegetativo.
Segundo o documento, em relação a safrinha de milho, que tinha início previsto para janeiro, a projeção de área plantada ainda está indefinida. Por conta da desuniformidade das chuvas, o atraso no plantio da soja em todo o país criou uma expectativa de risco por conta do ciclo da cultura, que poderá continuar se desenvolvendo ainda em fevereiro. Essa tendência encurtará a janela de plantio mais favorável para o milho de segunda safra.
A estimativa nacional do plantio de milho da CONAB, considerando a primeira, a segunda e a terceira safra, na temporada 2019/20, indica que veremos um crescimento de 0,2% em comparação a 2018/19. De acordo com o órgão, a produção total de toda essa área pode atingir 98,7 milhões de toneladas.
Soja
O acompanhamento da CONAB segue a visão do mercado e classifica o início da safra de soja como irregular por conta das questões climáticas. De acordo com o documento, na Região Centro-Oeste, as condições climáticas registradas foram variadas e esse cenário impactou na evolução do cultivo.
Nas Região Nordeste, particularmente em Matopiba – região que compreende os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia -, as precipitações aconteceram dentro da normalidade a partir de dezembro de 2019, com maior intensidade na primeira quinzena do mês. Na sequência, as chuvas se apresentaram de forma reduzida nas diversas regiões produtoras, o que foi insuficiente para assegurar a umidade do solo para o plantio das culturas de uma forma segura.
O último relatório do órgão, publicado em 8 de janeiro desse ano, não apresentou ajuste na estimativa de produtividade da soja. No entanto, em agosto de 2019 a CONAB havia disparado em seu relatório que os produtores colheriam cerca de 121 milhões de toneladas da oleaginosa na safra 2019/2020 – o que na época, já havia sido contestado por diversos produtores, de acordo com notícia do portal Canal Rural.